Publicado: 02/09/24 às 11h07
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A Constituição Federal de 1988 definiu que o Imposto sobre Propriedades de Veículos Automotores (IPVA) é tributo de competência dos Estados e do Distrito Federal. Como sua própria denominação sugere, é exigido dos proprietários de veículos automotores, usualmente no início de cada ano.
O fato gerador do IPVA é a propriedade de veículo automotor.
Antes exigido somente sobre veículos terrestres, com a promulgação da Emenda Constitucional nº 132/2023 (que trata da reforma tributária) será possível a cobrança do imposto também sobre embarcações e aeronaves (ainda pendente de lei a ser editada pelos Estados para regulamentar a cobrança), comportando as exceções listadas nas alíneas do inciso III do § 6º, artigo 155 da Constituição Federal, como tratores e máquinas agrícolas, por exemplo.
O fato gerador para veículos usados, conforme disposição nas normas dos Estados, considera-se ocorrido em 1º de janeiro (como, por exemplo, dispõe a Lei nº 2.877/1997, do Rio de Janeiro) ou no primeiro dia útil de cada exercício (como na Lei nº 18.305/2023 de Pernambuco).
Em regra, para veículos novos o fato gerador considera-se ocorrido na data da aquisição pelo consumidor final.
A base de cálculo do IPVA é o valor venal do veículo, conforme tabela disponibilizada pela FIPE – Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas.
O Senado Federal tem a prerrogativa de fixar as alíquotas mínimas do IPVA, conforme disposição do § 6º ao artigo 155 da Constituição Federal, incluído pela Emenda Constitucional nº 42/2003. Inobstante a existência de projetos de Resolução, apenas a de nº 15/2022 foi aprovada, dispondo sobre a alíquota mínima de 0% (zero por cento) para veículos de duas rodas de até 170 (cento e setenta) cilindradas.
Assim, as alíquotas são fixadas por cada Estado, podendo ser distintas em função de características dos veículos ou dos contribuintes. A título de exemplo, São Paulo exige o imposto à alíquota de 2% para ônibus, micro-ônibus e motocicletas, e 4% para automóveis de passeio; já o Estado do Pará prevê a alíquota de 3,5% para carros e motos em geral, e 1% para ônibus, caminhões ou veículos e movidos a gás natural veicular, entre outros.
A possibilidade de adoção de alíquotas diferenciadas em função do tipo e utilização do veículo já estava prevista na Constituição Federal (artigo 155, § 6º, inciso II). Com a Emenda Constitucional nº 132/2023, passou-se a prever, também, a diferenciação em razão do impacto ambiental e do valor do veículo, abrindo margem para a cobrança de forma progressiva, a exemplo do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF).
O IPVA foi inserido na legislação brasileira através da Emenda Constitucional nº 27, de 28 de novembro de 1985, ainda na vigência da Constituição de 1967.
Atualmente é previsto no artigo 155, inciso III e § 6º da Constituição Federal, inexistindo até o momento lei complementar federal a respeito deste tributo. O Código Tributário Nacional, publicado anteriormente à criação do IPVA, também não trata do imposto.
Cada Estado regulamenta o IPVA através de norma própria, a exemplo da Lei nº 6.017/1996 (Estado do Pará), Lei nº 6.348/1991 (Estado da Bahia) e Lei nº 7.431/1985 (Distrito Federal).
O contribuinte do IPVA é o proprietário do veículo.
Sim, o IPVA é um imposto cumulativo, incidindo anualmente sobre o valor venal do veículo.
Existem isenções do tributo? Se sim, é possível citar exemplos de setores beneficiados?
Sim. Ainda que a legislação do IPVA varie conforme o Estado, é usual a instituição de isenção para condutores com deficiência, carros de aluguel (táxi) e sobre veículos com determinado tempo de fabricação (10 anos no Amapá, 18 anos no Mato Grosso ou 30 anos em Santa Catarina, por exemplo).
O IPVA é arrecadado pelo Estado e 50% do valor arrecadado deve ser distribuído ao Município de emplacamento do veículo automotor terrestre, conforme previsão do artigo 158, inciso III da Constituição Federal.
Para os veículos aéreos e aquáticos, o Estado deve destinar os recursos ao Município de domicílio dos proprietários, conforme disposição da Emenda Constitucional nº 132/2023.
Trata-se de tributo de competência estadual, conforme previsão do artigo 155, inciso III da Constituição Federal.
O IPVA é lançado anualmente.
O IPVA é um imposto de caráter prioritariamente arrecadatório, mas pode ser dotado de função extrafiscal. Um exemplo é quando o estado isenta ou reduz as alíquotas para veículos elétricos ou híbridos. Através desta redução, busca-se incentivar a utilização de tais veículos que, por possuírem menos potencial poluente, contribuem para a preservação do meio ambiente e da qualidade de vida da população em geral.
A Emenda Constitucional nº 132/2023 dispôs expressamente que o impacto ambiental passou a ser um fator a influenciar as alíquotas do IPVA, o que pode ser traduzido em minoração ou isenção do imposto sobre veículos menos poluentes e/ou majoração da carga tributária para os poluentes.
O IPVA é lançado de ofício pela Fazenda do Estado, usualmente no início do ano, cumprindo ao contribuinte realizar o recolhimento no prazo definido pelo fisco.
As obrigações acessórias inerentes ao IPVA são relacionadas a prestação de informações aos órgãos responsáveis (sobretudo os de trânsito) sobre alterações de proprietário ou das características do veículo.
As críticas ao IPVA são em geral relativas à política fiscal. Por muito tempo bradou-se a necessidade de cobrança do imposto sobre aeronaves e embarcações, cujos proprietários possuem presumidamente mais renda que os proprietários de automóveis populares, que sempre suportaram o IPVA. Com o advento da reforma tributária (Emenda Constitucional nº 132/2023), a cobrança sobre aeronaves e embarcações foi viabilizada e deve ser implementada pelos Estados.
Ainda, há algumas críticas sobre a forma de cobrança atual, que considera o valor constante da tabela FIPE para base de cálculo (valor venal), que ordinariamente é superior ao valor de mercado.
Além de discussões pontuais no âmbito dos Tribunais de Justiça relacionadas à amplitude das isenções concedidas pelas normas locais, as grandes controvérsias relativas ao IPVA se referem à denominada “guerra fiscal”, na qual se questiona a legitimidade ativa dos Estados para a exigência do tributo. Como o IPVA é regulamentado por cada Estado, é comum que os contribuintes busquem atrair a incidência do imposto para o local no qual a alíquota é mais baixa.
Esta controvérsia é particularmente sensível para as locadoras de veículos, que se estabelecem e buscam emplacar seus veículos em locais com tributação mais benéfica (Minas Gerais, por exemplo), porém que circulam em diversos outros Estados do País.
Neste particular, em setembro de 2020 o STF decidiu no Recurso Extraordinário (RE) nº 1.016.605, julgado sob o rito de repercussão geral (tema nº 708), que “A Constituição autoriza a cobrança do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) somente pelo Estado em que o contribuinte mantém sua sede ou domicílio tributário”.
Já na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4.612, na qual se analisou a Lei nº 7.543/88 do Estado de Santa Catarina, com as alterações promovidas pela Lei nº 15.242/10, o voto do Ministro Dias Toffoli, que capitaneou a corrente vencedora, ponderou que “a capacidade ativa concernente ao IPVA pertence ao estado no qual está localizado o estabelecimento (domicílio da pessoa jurídica) a que se vincula, de modo substancial, o automóvel e é nele que deve ser realizado o licenciamento”, refutando a possibilidade de licenciamento do veículo em outra unidade federada tão somente para pagar menos tributos, pois nesta hipótese o vínculo entre o bem e este Estado seria meramente formal.
A tramitação da ADI não foi finalizada, estando pendente a apreciação de Embargos de Declaração, com determinação de sobrestamento em março de 2024 até a apreciação do Agravo em Recurso Extraordinário (ARE) nº 1.357.421.
Assim, a solução definitiva para a discussão deve efetivamente ocorrer no ARE nº 1.357.421, cuja repercussão geral foi reconhecida em fevereiro de 2022 (tema nº 1.198), para submeter ao crivo do STF a seguinte controvérsia: “Constitucionalidade da cobrança do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) por Estado diverso da sede de empresa locadora de veículos, quando esta possuir filial em outro estado, onde igualmente exerce atividades comerciais (distinção do Tema 708, RE 1.016.605)”.
O distinguishing da controvérsia a ser apreciada no ARE nº 1.357.421 (e na ADI nº 4.612) em relação ao RE nº 1.016.605 (tema nº 708) é o fato do primeiro analisar o contexto de pluralidade de estabelecimentos de um mesmo contribuinte em mais de um Estado, diferentemente da situação fática analisada no segundo. Ainda, segundo a decisão do STF que reconheceu a repercussão geral, no tema nº 1.198 será analisado o cenário de “concentração dos licenciamentos da frota da locadora no estado de sua sede, apesar da distribuição dos veículos para circularem nos estados onde estão estabelecidas suas filiais”, o que não se afigurava no tema nº 708.
Portanto, muito embora o STF tenha decidido sobre a legitimidade para cobrança do IPVA dos Estados em que o contribuinte possua sede ou domicílio, ainda há de ser dirimida a discussão em situações nas quais o contribuinte possui estabelecimentos (filiais) em mais de uma unidade federada.